quinta-feira, 16 de maio de 2013

O espelho real da alma

Palavras deveriam ter mais valor. Esse instrumento que nos permite fazer entender com uma perfeição única poderia trazer consigo inúmeras consequências sadias se todos conseguissem decifrar o que vem do coração ou fazer valer o sopro que ele envia. Por vezes, o vemos perder-se entre o imaginário, o instantâneo e a concretização. Diz-se, mas não realiza. Responde-se de imediato a um questionamento, entretanto, quando chega o momento de tornar o dito real, ele se desvia por objetivos e necessidades aparentes...

Juras não valem apenas para amores. Elas fazem parte de nossa relação humana, seja com amigos, conhecidos ou mesmo estranhos. Realizar aquilo que se diz é muito mais que ser coerente. É sincronizar com perfeição o caminho dos sentidos e mostrar uma faceta real que o torna diferenciado exatamente por não ser um exercício comum. Tantos dizem que defendem determinado ponto de vista e quando se veem nele, afugentam-se em seus medos e covardias que o dito torna-se como uma fumaça se dissipando no ar... Há também os que fazem promessas e deixam suas “verdades” para trás. Outros que mal conseguem viver no presente aquilo que dizem ser ou acreditar. Será que as aparências realmente assumiram o espaço do verdadeiro? Pode ser melhor visto aquele que se embevece de sua vaidade e cria um personagem que, entre os meandros que percorre para agradar um e outro, se forma em um todo desconexo? Agradar pela superficialidade é fácil, porque o superficial não toca a carne. O verdadeiro às vezes machuca, porque é profundo, atinge a alma.

Assumir sua real essência não te dará uma vivência regular, morna. Você vai ter momentos de descoberta incríveis e de reconhecimento que valem muitos anos de falsas aparências. Mas também se deparará com aquele que não compreende o que é ser inteiro, sentir, pensar, realizar com coesão e transparência. Isso muitas vezes provocará alguns choques, mas valerá a pena. Porque o simples fato de ser inteiro te mostrará que alguém pode te ferir quando não te compreende ou não faz o uso ideal das palavras que diz, mas que a sua verdade será o seu alicerce para se reerguer e também o seu guia para chegar ao objetivo que almeja.

               
Transparência é maturidade. Coerência entre o pensado, o dito e o realizado é o exercício ideal de quem não quer apenas “estar”, e sim “ser” e se fazer entender, mesmo que não assuma uma posição de destaque no mundo das aparências.

Dê valor ao que diz ao ponto de torná-lo o caminho para os seus atos. Use as palavras a seu favor - não para se esconder daquilo que pulsa internamente em ti, mas para que elas se tornem o espelho real de sua alma. 

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

A alegria "oásis" que fez a diferença


Poderia não estar escrito no roteiro da vida, mas era uma obra fantástica do destino. A predestinação do encontro se fazia acontecer por atração de almas, a necessidade de que uma tocasse a outra e mudasse, para sempre, a sua percepção da existência. Um convite para o casamento de uma amiga querida, uma história de amor que merecia ser celebrada e a oportunidade única de rever amigos: não poderia recusar, mesmo que a distância tentasse ser um obstáculo. Venci o tempo e os quilômetros e lá estava eu, ao lado de conhecidos, pessoas com quem convivi durante quatro anos, e desconhecidos. Mas havia algo diferente. Olhava para os então novatos em minha história e sentia-os muito mais perto que estranhos quaisquer.

A festa começou. Todos dançavam alegres, bebiam, comiam e riam, riam muito! Ali era compartilhada aquilo que muitos talvez ainda não experimentaram em sua essência: a alegria em sua manifestação mais simples e pura, o contentamento em dividir algumas horas com pessoas que fizeram a diferença em nossa caminhada. Tão logo as festividades se iniciaram, uma pessoa me chamou a atenção. Estava próximo à churrasqueira, tomava cerveja com uma satisfação e um sorriso impagável no rosto. Dava gargalhadas, beijava os amigos, abraçava-os com um contentamento peculiar. Aquele homem de cabelos brancos, barrigudo e que usava óculos parecia celebrar algo a mais. Chamou-me para dançar e eu, claro, não pude recusar a um convite tão entusiasmado. Demos alguns passos, rodopiamos e começamos a rir de nossa performance desajeitada. Ele se apresentou e continuou a dançar alegremente.

A noite seguiu assim até o sol começar a dar sinais de que estava a chegar. Depois de soltar fogos com os amigos, de nos abraçar mutuamente, de ouvir juras do casal recém unido e de nos divertir como crianças, demos voz ao nosso cansaço e nos repousamos.

Já por volta de meio-dia, levantei-me da cama e ouvi um samba animado que embalava a varanda daquela casa onde acontecera a festa. Senti um cheiro peculiar de churrasco e escutei vozes alegres que cantavam e relatavam histórias. Uma delas me chamou a atenção. Quando desci para ver o que se passava, lá estava ele: o mesmo homem que na noite anterior aproveitara a festa de uma maneira especial continuava a celebrar.

Almoçamos e, quando nos reunimos na cozinha para lavar a louça, ele me convidou a bater as panelas e a cantar. Libertei-me de toda a timidez, peguei uma colher de metal e passei a batucar a panela com força, seguindo a cadência do maestro da alegria! Começamos a rodopiar pela cozinha e cantávamos cada vez mais alto para um público de quatro, cinco pessoas que assistiam com os olhos brilhando. Quando dávamos sinal de que íamos parar, lá vinha ele, engatando uma nova melodia. Assim se seguiu por bastante tempo até que o silêncio pediu para entrar. Não se ouvia mais nada. Todos se olharam, paralisados por algum encantamento. O homem que ora celebrava rompeu a ausência de ruídos e disse-me: “venha aqui e coloque a mão em meu coração”. Sem hesitar, fui até ele e estirei a minha mão até o seu peito. Senti algo estranho e logo tirei, assustada. “Calma, moça, isso é apenas um cateter. É por aqui que entra o veneno que me mantém vivo. Eu tenho câncer em metástase e faço quimioterapia a cada 15 dias”. Mais uma vez, um profundo silêncio tomou conta do ambiente e invadiu os nossos corações. O meu, especialmente, passou a ser dominado por um aperto grande, inexplicável. Ele continuou: “a cada sessão, passo de nove a dez dias prostrado, sem conseguir levantar-me ou comer. Não posso tomar banho por alguns dias para não molhar a sonda e fico praticamente entregue. Mas tenho os meus quatro dias que antecedem uma nova sessão e esses são dias preciosos para mim. Então, o que eu faço? Festa, muita festa! Celebro muito, aproveito cada minuto e chego a esgotar-me de tanto entusiasmo. Assim tenho forças para enfrentar mais uma batalha e  viver a vida com a maior satisfação”.

Não pude responder-lhe. Não tive forças. Naquele momento, senti-me como um grão de areia diante da imensidão do deserto. Quem eu era perto daquele homem, que jamais me aparentou ter alguma doença, o qual eu nunca imaginaria que estaria com um diagnóstico tão grave? Sua alegria foi maior que qualquer desventura do destino. Sua vontade de viver pulsava muito mais forte e dominava o seu corpo de uma maneira tão contagiante que as células doentes mal tinham espaço para se manifestarem. Após esse discurso que emudeceu a todos, ele pegou novamente a panela e recomeçou a cantar. Busquei forças de onde eu nem imaginaria ter, permiti-me ser dominada por aquela satisfação rara e sincronizei meu canto ao seu.

Foi assim que nos conhecemos, que nossas almas trocaram a luz mais verdadeira e que pudemos carregar um pouco de um no outro. Hoje, essa querida pessoa despediu-se desta encarnação, porque sua missão lá em cima certamente será ainda maior. O meu coração, que ora sentiu uma alegria que jamais havia experimentado, hoje chora a perda, mas se contenta pela oportunidade única de ter conhecido esse ser tão especial. A vida segue, com seus tropeços, suas intemperanças, surpresas às vezes nem tão agradáveis. Mas se soubermos extrair a sua verdadeira essência, como esse homem soube fazê-lo com uma maestria impecável, teremos a oportunidade de experimentar por quatro, cinco, dez ou mais dias esse entusiasmo “oásis”, que é capaz de contagiar, iluminar e tocar a essência de quem participa do roteiro de nossa história.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

O dia em que o ônibus parou


Se tem algo que posso agradecer a São Paulo é pelo verdadeiro estágio sociológico, antropológico e emocional que tem me proporcionado. Em meio a tantos milhões de moradores, consigo tirar, quase que diariamente, uma história que vale a pena ser dividida.

Hoje foi assim. Estava pegando o meu segundo ônibus para ir para a casa, já cansada pelo longo trajeto, quando escutei um choro forte, como que de uma criança. Ao me virar para entender o que estava acontecendo, vi o trocador debruçado sobre a caixinha de dinheiro, chorando inconsolavelmente. Ali, vi um homem magrinho e pequenininho, que, provavelmente, nascera com uma deficiência física. Mas, apesar da estatura e do choro forte, quem estava diante de mim era um homem de verdade, que se viu fragilizado por um acontecimento do destino. Sua namorada acabara de lhe ligar, dizendo que a mãe havia falecido. Curiosamente, quem chorava era o genro, mas como um filho verdadeiro.

O ônibus parou. Todos olhavam para ele com um semblante assustado ou de impotência diante de seu choro que ficava cada vez mais alto e forte. Em minha cabeça, milhares de coisas passavam, mas, naquele momento, eu só pensei em rezar e rezar, pedindo a Deus que aliviasse a dor daquele pequeno grande homem. Após ele se acalmar, seguimos viagem, mas ainda escutávamos alguns soluços baixos, indicando um choro guardado.

Uma mulher foi, então, falar com ele. Escutei-o dizendo que a sogra morava em outra cidade e que a namorada tinha ido visitá-la no fim de semana.  A mulher assumiu o discurso e somente ouvi o final: “ah, a vida é assim, né? Todos nós esperamos morrer um dia e bom... Foi o que aconteceu”. Confesso que assustei-me com a frieza dela. Seria um reflexo de uma dor passada, a assimilação da vida em um grande centro ou a falta de palavras certas para consolá-lo, mesmo que bem intencionada? O fato é que não resolveu. Com o ônibus em movimento, escutei novamente um choro forte e quando olhei para a direção em que ele ficava, o vi sentado no chão, agora ainda mais pequenino e frágil, com as mãos nos olhos enxugando as lágrimas que caíam. Meu coração apertou, mas, diferentemente da mulher, não consegui ter a mesma coragem de ir consolá-lo, talvez por também não ter as palavras perfeitas para aliviar a sua dor.

Vi uma mulher de branco se levantar. Provavelmente uma enfermeira, acredito. Ela aproximou-se dele e falou-lhe algumas palavras em seu ouvido e, lentamente, ele foi se acalmando. Talvez a sua experiência em lidar com dores e sofrimentos diários a fizera preparada para ajudá-lo naquele momento difícil. Porque a vida é assim: ela nos prepara com exercícios práticos. Quanto mais lidamos com os obstáculos em nosso caminho ou nos caminhos de quem convivemos, mais nos tornamos fortes e maduros.

Alguns minutos depois, chegou o meu momento de descer do ônibus. Eu olhava para o cobrador, sentia uma vontade imensa de me aproximar, de ajudar, dizer algo, mas, ao mesmo tempo, enxergava a minha impotência para resolver o problema.

Desci do ônibus, caminhei um pouco e parei. Pensei em tudo o que acontecera e busquei entender o que significou a manifestação da dor daquele rapaz. Provavelmente, ele se colocou no lugar da mulher amada, que perdera a mãe e certamente estaria desconsolada. Muita gente poderia duvidar que um homem pequenino, com estatura quase que de uma criança, pudesse ter um relacionamento sério, um apoio e um amor a zelar. E ao vê-lo chorando, percebi o valor que essa pessoa tem em sua vida. Ela tem tamanha importância que ele conseguiu sentir a dor dela e não se conteve, mesmo diante dos vários olhares curiosos e amedrontados. Que bela lição de amor! Ainda que muita gente possa olhá-lo com pena (o que, infelizmente, ainda é um sentimento natural em nossa sociedade - e não me excluo desse meio), ele tinha alguém que o valorizava com ser humano, que o amava como homem e que o escolhera também para dividir a sua dor.

Foi um momento paradoxal, de uma fusão de vários sentimentos ao presenciar uma cena tão inusitada. Mas saí dali certa de que somente uma coisa irá curar a tristeza que ele sentira: o amor. O amor que ele tem para dar a sua namorada e o que tem a receber dela. O amor que ele sentiu dessas voluntárias que tentaram ajudá-lo. E o amor de ter sido “visto” de verdade, mesmo que, para isso, precisasse chorar e dividir a sua dor conosco.

Ninguém é tão forte que não possa fraquejar. E ninguém é tão fraco que não possa usar dessa mesma fraqueza para mostrar a grandeza de sua alma. 

domingo, 21 de outubro de 2012

A fórmula do amor

Relacionamentos. Está aí uma palavra que norteia diversas discussões, livros de auto-ajuda, conversas em um bar. Por que será que todo mundo tem uma “teoria” para se conquistar a pessoa amada? Homens dizem que as mulheres devem ser firmes, não podem demonstrar o sentimento ou sufocarem-nos. Mulheres querem homens galanteadores, que ligam no dia seguinte, dizem palavras elogiosas e demonstram interesse. E nessa troca de teorias, perde-se a naturalidade e cai-se em um dramalhão de autocontrole ou mesmo de atitudes superficiais que, à primeira vista, podem dizer algo, mas internamente nada significam.

Será que existe alguma "fórmula do amor"? Antes de revelar uma pequena descoberta, deixo aqui a minha teoria interna, pra não desmentir o que levantei anteriormente: seja você mesmo, não crie um personagem para agradar o outro, porque se hoje você se faz uma pessoa que não é de verdade e atrai um alguém, certamente ele ou ela não é para você, e sim para quem se assemelha ao tipo interpretado. É simples: o destino faz o papel de aumentar as possibilidades de encontro, mas, muitas vezes, antes de ele acontecer, caímos em uma “armadilha” e deixamos o verdadeiro para trás. Não se apegue demais, não acredite que daquele dia “fatal” em diante você está fadado a ser dependente de alguém. Se não o era antes, não significa que será. Essa dependência que você acredita já existir é construída ao longo dos anos, com a convivência, a necessidade de um de se somar ao outro, e não depois de trocar algumas poucas palavras ou beijos calorosos.

Muitas vezes, não entendemos porque relacionamentos duradouros acabam. Talvez seja exatamente pela descoberta de que essa “dependência” era uma fantasia interna. Consegui entender melhor essa ideia ao assistir a um famoso seriado americano, quando uma personagem mulher, de personalidade forte, respondeu às amigas que queriam entender o motivo de um relacionamento de 7 anos ter acabado. Em uma resposta direta ela trouxe à tona uma verdade simples que eu talvez não enxergara antes, com tamanha nitidez: “nosso caso acabou porque eu descobri que tenho um amor mais forte, verdadeiro e duradouro que este de 7 anos. É um relacionamento de 30 anos: comigo mesma.” Dali em diante entendi que você somente irá conseguir se sentir bem com outra pessoa quando as suas metades estiverem completas. Tá bem: acabo de quebrar aquela famosa máxima da “cara metade”. E não hesito em dizer que sim. Prefiro falar em uma completude interna, que nos acrescenta tanto ao ponto de nos tornarmos preparados para dividir um pouco do que somos com alguém. E aí, sim, nessa troca de pessoas “inteiras” se descobre uma relação madura e sadia.

Mulheres: não é preciso esconder sentimentos, deixar de correr atrás e se afogar em uma paranóia à espera da atitude do homem. Primeiramente: se vocês se amarem o suficiente já estarão livres dessa ânsia pela ação deles. Entenderão que ela virá se tiver de vir, se for sincera o bastante para romper as barreiras da vergonha, dos temores internos ou dos padrões. Homens: não minimizem todas as atitudes das mulheres como pedantes ou sufocantes. Mulheres modernas e seguras de si correm atrás de seus objetivos. E se elas querem vocês, irão procurá-los sim, por quê não? Pouco importa se vocês querem ou não levar isso adiante. Só por superar suas conspirações internas sobre o que vocês pensam delas e ir atrás para descobrir verdadeiramente, as mulheres tem o seu valor.

Não se brinca com os sentimentos, da mesma forma que não se cria tipos ou reações padronizadas sobre o que dá certo ou não. Cada pessoa tem a sua identidade, o seu traço específico, e, portanto, uma reação particular. Sair da mesmice, fugir ao que dizem por aí ser a “fórmula do amor” já é o primeiro passo para uma experiência incrível, daquelas que só se descobre o resultado quando a verdade é a catalisadora.

domingo, 16 de setembro de 2012

Choque de realidade


Engraçado como aquilo que instiga, que não se explica facilmente ou está mal resolvido é o que mais te segura. Não que isso signifique, necessariamente, algum sentimento de apego. Mas quem nunca se viu naquela necessidade te ter controle sobre tudo? Basta algo fugir da sua concepção, que passa a ocupar o centro das suas ideias vagas e pensamentos fortuitos. Você bem que procura se desligar, afinal, se não teve sentido é porque não faz parte da sua história. Só que não é bem assim.

Aquela máxima de que, “tudo que vem, vem por algum motivo” tem lá os seus fundamentos e, se algo está mal explicado, é sinal de que precisa ser decifrado, nem que seja para ter sentido somente no seu passado. Não quer dizer que aquilo que aconteceu há algum tempo e seja resolvido hoje, deva mudar o estado atual das coisas. E nem sempre muda. O que se transforma é a sua maneira de lidar com o novo, porque você aprendeu com aquilo que, um dia, fora importante.

Deixar mágoas, problemas e discussões para trás pode aliviar a sua dor temporariamente. Mas não há nada que esteja mal resolvido que não possa voltar. E para que o ciclo se encerre, é preciso remoer sim; mesmo que doa, mesmo que traga novos pesares. É como uma mudança de vida, de casa, de cidade: você demora a se adaptar, porque mexeu com aquilo que, aparentemente, estava em perfeita ordem. Lidar com sentimentos passados pode (e deve) provocar certa reviravolta em seu interior.

Aproveitando-me de um clichê, eu poderia simplificar, metaforicamente: “a beleza da borboleta só acontece porque aquele bichinho ‘feio’ se permitiu uma mudança”. Com a nossa essência isto também acontece: o que pode não ter mais sentido, mas ainda incomoda, precisa ser tocado para que o ruim dê espaço a algo bom. Não se diz: “tudo bem, não diga nada, eu perdoo”. Isto não irá acrescentar em ti e nem na pessoa com a qual você se magoou. Primeiro, porque não existe mágoa isolada. E segundo, porque as mudanças só acontecem por motivações fortes e pertinentes. Problemas precisam sair da esfera dos pensamentos e ganhar o mundo real. Precisam ser materializados para que possam ser, enfim, anulados.

Diz aqui uma defensora convicta da “terapia do choque”: aquela que nos desperta, que nos abre um horizonte de possibilidades bem diferentes das atuais. A mentira alivia por algum tempo, mas só a verdade é capaz de tocar verdadeiramente a alma. Ou você prefere travar uma briga interna entre o disfarce de algo que já está enfadonho em seus pensamentos e a vontade de desvendar-lhe?

Para o devaneio, realidade. Para a mágoa, verdade.

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Retalhos de um conselho amigo

Uma visão sobre idas e vindas do amor que pode ser aplicada a situações e contextos diversos...

Muitas vezes não entendemos o rumo que os acontecimentos tomam em nossa vida e só vamos compreender quando já estamos em outra situação futura, e ali visualizamos nitidamente o quão importante foi o percalço do passado. NADA É POR ACASO, nem os sortilégios e nem as decepções. Tudo tem um sentido, talvez não muito claro a nós porque não conseguimos racionalizar sobre todos os acontecimentos. Somos (e devemos ser) metade emoção e metade razão. Quem pende demais para o lado racional e quer encontrar as respostas, se vê em um labirinto onde a dor é a frustação de não conseguir ter um controle maior sobre os fatos e suas consequencias. Já quem estende demasiado à emoção, se perde na ingenuidade de ser "trapaceado" pelos imprevistos que o destino nos apresenta. Por isso, por mais que seja dolorosa a ruptura, tente se manter em equilíbrio. Somente quando as coisas estão em seu lugar certo é que conseguimos visualizar melhor os horizontes. ("Epifanado" em 27/04/10)

sexta-feira, 27 de maio de 2011

Momento Clarice




Pensei em temas, viajei pelo meu mundo mais íntimo, observei gestos, palavras... Discuti sobre sentimentos, busquei extraí-los das mais inimagináveis situações e nada... Como eu poderia escrever um texto sem ter, ao menos, um tema? Como as palavras poderiam brincar no papel, dando um sentido que fizesse o leitor mergulhar nas entrelinhas, acionar o seu imaginário e encontrar, enfim, uma motivação para continuar a decifrar os vocábulos?

Mas, então, surgiu-me Clarice. Sim, a célebre escritora Clarice Lispector. Forte, decidida, uma verdadeira amiga íntima das palavras e do que há de mais belo e, ao mesmo tempo, inquietante na essência humana. Ela foi a minha inspiração para iniciar os “rabiscos digitais”. Deste decidido ponto de partida, encontro o “tesouro” ambicionado: a frase, inspiração maior – “Minhas desequilibradas palavras são o luxo do meu silêncio”. Era isto! Eu precisava delas, as palavras, para dar molde ao meu silêncio... Complexo? Paradoxo? Poderia ser se eu não me dispusesse a testar a teoria. Em pouco mais de dez linhas instantaneamente preenchidas, encontro uma paz esquecida, um afago que somente elas, as palavras, podem me trazer. Posso pensar não estar sentindo nada... Mas elas traduzem por mim: não há vazio que não seja inteligível. Ele também pode nos indicar a necessidade iminente de ser preenchido por algo, por certo, um objeto de desejo.

Quem vive sem desejos? Quem é capaz de abandonar a intermitente mania de imaginar um futuro, tentando inserir personagens, conquistas, estados de espírito...? E são eles: os fragmentos de pequenas previsões instantâneas que começam a se soltar deste silêncio. Quis ser, quis ter, quis estar. E cá estou eu. Descobrindo que pouco ou nada destes estilhaços de um futuro longínquo tem significado agora. O que eu vivo, o que eu sinto, é que deveria importar. Choque de realidade!

A palavra, o verbo, a ação, a motivação. Ela me mostrou que de nada vale se sustentar em devaneios, quando se perde do que se vive, do que se quer viver agora. Esquecemos que somos felizes, que estamos felizes, simplesmente porque sequer nos dedicamos a refletir o presente, a desfrutá-lo com toda a convicção de que cada minuto vivido é uma memória eterna. O que não se viveu, não se pode eternizar...

Já não sei mais onde estou ou deveria estar neste “esconde-esconde” temático. O sono se mistura ao instigante silêncio da madrugada... Os devaneios reaparecem e me perco entre a tentativa de descobrir se estou desperta ou quase mergulhada em um universo onírico, e, por certo, surrealista. De real, a epifania de hoje: quero viver e entender. Quero viver e saber. Quero viver e eternizar...

E novamente ela, Clarice:

“O que eu sinto eu não ajo.
O que ajo não penso.
O que penso não sinto.
Do que sei sou ignorante.
Do que sinto não ignoro.
Não me entendo e ajo como se entendesse...”